Então, o papo de hoje é sobre a importância do recrutamento muscular no treinamento com pesos e como isso pode influenciar diretamente os resultados dos exercícios.
O músculo é controlado de forma voluntária a partir da geração de impulsos elétricos que saem lá do sistema nervoso central e caminham até chegar na junção neuro-muscular, o ponto de conexão entre os nervos e os músculos (isso aí abaixo).
Lá nessa junção um neurotransmissor (acetilcolina) é liberado pelas vesículas sinápticas e inicia o processo de contração, fazendo com que a tensão no músculo e sua atividade metabólica aumentem, o que incentiva seu desenvolvimento.
Entretanto, o músculo não possui todas as fibras iguais, tão pouco do mesmo tamanho, e isso interfere em como o organismo se ajusta para fazer o movimento acontecer. Se você prestar atenção a isso, vai fazer seu treino ser mais eficiente.
Organização do tecido muscular
O músculo, apesar de parecer um tecido homogêneo, possui diferenças quanto as células (fibras) que o compõe.
As fibras musculares possuem claras diferenças, e podem ser divididas de várias formas. O jeito mais comum de fazer isso é classifica-las quanto a cor e tipo. Assim, temos fibras vermelhas (tipo I) e brancas (tipo II).
As do tipo I são menores, mais fracas e mais resistentes, e normalmente são recrutadas quando esforços mais leves são executados, como caminhar, por exemplo. As do tipo II são mais fortes, contraem mais rápido, mas também cansam com mais velocidade. Normalmente elas se unem as do tipo I e, em conjunto, ajudam a mover o musculo quando um esforço intenso é realizado. As fibras do tipo II ainda recebem uma subdivisão e são classificadas em IIa (intermediárias) e IIb (ou IIx, ou ainda IIb/x).
Mas como comandar tudo isso?
Para que o organismo possa escolher qual e quanto de cada fibra ele vai utilizar, ele modula (ajusta) a atividade elétrica que sai do córtex motor afim de produzir a ativação necessária para que a força muscular seja exatamente aquela necessária para executar a tarefa. Sem falta nem excessos.
O impulso elétrico que chega na membrana muscular gira ao redor de -70mV a +30mV, e não muda muito sua amplitude. Entretanto, é possível ter poucos ou muitos impulsos por segundo (frequência), o que interfere no total da atividade elétrica recebida no tecido.
Em um esforço leve, onde praticamente apenas as fibras do tipo I serão recrutadas, utilizamos frequências que vão chegar até no máximo uns 20-25Hz. Quando precisamos gerar um pouco mais de força, já que as fibras do tipo I não vão dar conta sozinhas do trabalho, aumentamos a frequência. Ao redor de 30-35Hz, temos a adição do primeiro sub-tipo das fibras do tipo II, as fibras IIa, que somam sua força às fibras do tipo I e permitem ao músculo gerar mais trabalho.
Entretanto, se esforço é máximo ou muito próximo dele, é necessário que a frequência aumente mais ainda (acima de 50-60Hz) e as fibras do ultimo sub-tipo (IIb/x) também se somem às duas primeiras e a maior intensidade possível de contração muscular seja executada.
Mas só dá pra recrutar o músculo todo quando a carga é enorme?
Então, não. A forma mais fácil de você conseguir recrutar o músculo como um todo é, realmente, colocar uma carga mais alta e executar algumas repetições até que a falha aconteça. Ir até o ponto onde você até tenta, mas não consegue mover o peso.
A cada repetição mais e mais fibras vão sendo ativadas, já que gradativamente o músculo vai recebendo mais e mais impulso elétrico.
Mas e se você fizesse diferente? Se ao invés de colocar uma carga enorme, a carga fosse relativamente baixa. Uns 30-40% do que você está acostumada a utilizar? Se ao invés de 20kg de cada lado da barra, estivessem apenas 6-8kg? O que iria acontecer?
Exatamente a mesma coisa! O mesmo nível de recrutamento!
A diferença é a forma como isso ocorreria.
No início do exercício, como o esforço é relativamente baixo, apenas as fibras do tipo I seriam recrutadas, e a primeira dezena de repetições aconteceria sem dificuldades. O problema é que existe algo chamado fadiga, e conforme o exercício aumenta, ela vai ficando cada vez mais forte.
Vai chegar em um ponto que as fibras do tipo I estarão tão cansadas que precisarão de ajuda, e seu sistema neural vai começar a aumentar gradativamente a intensidade dos impulsos para que cada vez mais e mais fibras, tanto do tipo IIa quanto IIx comecem a ajudar no movimento.
Mas se você continuar insistindo em realizar o exercício, mesmo com essa carga mínima, essas fibras também vão começar a cansar, e seu organismo vai gerar o maior impulso elétrico possível, tentando recrutar tudo quanto é pedacinho do seu músculo para fazer com que a barra continue se movendo.
Enfim, o recrutamento vai ser completo, da mesma forma.
Entendi, não é a carga, mas o esforço que determina o recrutamento…
Exatamente. Não interessa quanto peso tem na barra, o que faz a diferença é até onde você tenta ir quando estiver realizando o exercício. Se você vai começar de um jeito fácil e deixar ficar difícil depois de um monte de repetições, ou se vai ficar difícil já na repetição 5 ou 6, isso não importa.
Se você insistir até a falha ou próximo dela, o efeito no recrutamento é exatamente o mesmo.
Mas antes de eu terminar esse texto, deixa eu colocar umas minhocas na sua cabeça…
Se o mais importante para o desenvolvimento muscular é quanto você consegue recrutar do músculo, fazendo com que todas as fibras trabalhem até a falha, me responda uma pergunta: se depois de eu fazer um aquecimento, sentar na máquina e executar a primeira série até falha, garantindo o recrutamento do músculo completamente, porque eu executo uma segunda série? E uma terceira? E antes de inventar que mais volume é melhor, leia isso aqui…
Ou, por que eu faço mais de um exercício para o mesmo grupo muscular? Se exercício o exercício até a falha recruta o músculo como um todo, o que mais um exercício vai fazer? Vou te ajudar novamente, se você acha que diferentes exercícios vão recrutar diferentes porções, da uma lida nesse outro artigo…
E aí, o que você acha de tudo isso?
Espero ter ajudado… a complicar sua vida, não resolver não, rsrsrsrs
Grande abraço!